Última atualização em 13 de julho de 2023
No último sábado (8), na sede campineira do Sindicato dos Petroleiros do Estado de São Paulo (Sindipetro Unificado), aconteceu um grande evento comemorativo à histórica greve dos trabalhadores da Refinaria de Paulínia (Replan) em julho de 1983, durante o governo do general João Baptista de Oliveira Figueiredo, último presidente do regime militar.
De acordo com o órgão sindical, o chamado “Ato Político em Rememoração aos 40 Anos da Greve de 1983”, reuniu vários petroleiros que cruzaram os braços na época, sindicalistas, acadêmicos, além de convidados de honra como José Sérgio Gabrielli, ex-presidente da Petrobras (2005/2012), Eneá de Stutz e Almeida, atual presidente da Comissão de Anistia do Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania, e Priscilla Bittar, filha de Jacó Bittar, fundador do Sindicato dos Petroleiros de Paulínia e Campinas, o atual Sindipetro Unificado.
“Que honra estar aqui com todas essas pessoas! Trabalhadoras e Trabalhadores da Petrobras! Desafiaram a ditadura e resistiram! Que honra poder relembrar hoje mais uma vez, tudo o que aprendi com o Jacó, meu pai, líder sindical, político e trabalhador brasileiro”, postou Priscilla Bittar.
Foto: Rede Social
Foto: Rede Social
Na ocasião, além de apresentações de artistas da região, foi lançada uma exposição que conta a história da greve, através de textos e imagens, e um filme documentário de média-metragem sobre o movimento que causou a demissão de muitos petroleiros, mas também garantiu conquistas significativas para o setor petrolífero brasileiro – leia no final da matéria o “Histórico” da greve, assinado pelo jornalista Guilherme Weimann.
O presidente Lula (PT) enviou carta ao Sindipetro, saudando as quatro décadas da greve. “Fiz questão de enviar esta mensagem a vocês, que representam e defendem um dos maiores tesouros do povo brasileiro: a classe trabalhadora organizada”. No documento, o presidente também relembrou uma frase dita por um grande amigo pessoal e companheiro de jornada durante muitos anos: “Quero recordar uma frase do saudoso Jacó Bittar, fundador do Sindipetro-SP, do PT e da CUT, na sua última visita ao Sindipetro, em agosto do ano passado: “O importante é fazer história”.
Histórico da Greve, por Guilherme Weimann
Entre o fim de 1982 e o início de 1983, o governo do general João Baptista de Oliveira Figueiredo iniciou negociações com o FMI (Fundo Monetário Internacional) para adquirir empréstimos que pudessem refinanciar a dívida externa, que crescia exponencialmente desde o início da década de 70. Como condição ao empréstimo, entretanto, o FMI exigia o corte de gastos públicos.
Com isso, em maio de 1983, o governo federal enviou ao Congresso Nacional o decreto-lei nº 2025. O livro Paulínia: Petróleo e Política, organizado por Vinícius Caldeira Brant, aponta que a medida propunha a retirada de todos os benefícios dos servidores das estatais, estabelecia prazos para um corte total de 10% do efetivo das empresas e proibia novas contratações e investimentos por um ano.
A categoria de metalúrgicos foi uma das que apoiaram o movimento dos petroleiros de Paulínia.
Foto: Sindipetro/Arquivo
A categoria de metalúrgicos foi uma das que apoiaram o movimento dos petroleiros de Paulínia.
Foto: Sindipetro/Arquivo
Para o ex-diretor da diretoria cassada em 1983, Pedro Luiz de Campos, os decretos contribuíram para o processo de mobilização dos petroleiros. “Realmente eram decretos em cima de decretos, só prejudicando trabalhadores, então eu tinha certeza que alguma coisa iria acontecer. Então, para mim, não foi novidade [a decretação da greve]. Sabia que a base estava unida politicamente e todos esperavam que a greve iria sair”, recorda.
Foi então que diversos sindicatos, incluindo do Sindipetro de Campinas, começaram a discutir a possibilidade de realização de uma greve. Devido a comoção pública, o governo retirou da pauta o decreto-lei, mas por pouco tempo. Dias depois, no dia 29 de junho, lançou mais um decreto (nº 2036), que cortaria os benefícios apenas dos novos admitidos. Com isso, a ameaça passou a ser a rotatividade do emprego. Neste mesmo dia, uma nova assembleia dos trabalhadores da Replan ratificou a greve por ampla maioria (quatro votos contrários e mais de 700 favoráveis) com a seguinte pauta: garantia de emprego e revogação do decreto-lei nº 2036.
Por receio de que a Petrobrás mantivesse dois grupos de trabalho dentro da refinaria, em turnos rotativos de 12 horas – o que inviabilizaria a parada de produção –, o sindicato decidiu antecipar a greve, prevista inicialmente para começar no dia 6 de julho. O grupo que entraria às 23h30 do dia 5 de julho ficou do lado de fora da refinaria. Com isso, o grupo que havia entrado às 15h30 do dia 5 de julho seria o responsável por manter a unidade funcionando até que as negociações avançassem – o que não ocorreu.
Além de não abrir negociação, o ministro do Trabalho, Murilo Macedo, decretou intervenção no sindicato às 12h do dia 6 de julho. Às 14h45, devido à exaustão dos trabalhadores, a refinaria parou por motivos de segurança.
No dia 7 de julho, cerca de dois mil trabalhadores da Refinaria Landulpho Alves (Rlam), na Bahia, também cruzaram os braços, apesar da repressão policial. Assim como em Campinas, o sindicato dos petroleiros baianos sofreu intervenção instantânea.
Além deles, várias categorias decidiram entrar em greve contra a política de austeridade do governo e em solidariedade aos trabalhadores da Replan. De acordo com os números divulgados pela imprensa na época, aproximadamente 100 mil metalúrgicos pararam no ABC. Também entraram parcialmente em greve os metroviários de São Paulo.
No dia 11 de julho, após 6 dias de intensas mobilizações, a greve foi encerrada. No dia anterior, chegara a notícia de que as refinarias de Cubatão, São José dos Campos e de outros estados do país não entrariam em greve e que a paralisação dos metalúrgicos havia terminado. Com esse isolamento imposto pelo governo, os petroleiros da Replan decidiram pelo fim da greve em votação acirrada: 160 a favor e 148 contra. O mesmo ocorreu na Rlam.
Mesmo com o apoio de algumas categorias, os petroleiros da Bahia e de São Paulo não conseguiram sustentar a mobilização. O saldo foi traumático: 206 demitidos na Rlam e 152 na Replan, com a intervenção em ambos os sindicatos. Além disso, os que voltaram após o fim da greve conviveram com um clima de perseguição por parte dos gerentes.
Apesar de todo esse cenário adverso, a solidariedade foi instantânea e a pauta pelo retorno dos demitidos passou a ser central. Ademais, a retirada do decreto-lei nº 2036 mostrou que, se houve grandes perdas por parte dos petroleiros, as conquistas também foram significativas, barrando as privatizações e mantendo o monopólio estatal do petróleo por vários anos.
Além disso, a organização da categoria fez com que todos os petroleiros retomassem os seus postos de trabalho. A integrante da diretoria cassada em 1983 e liderança histórica da categoria, Wanda Conti, relembra como foi essa articulação: “A greve de 83 foi o grande marco da nossa vida sindical, foi o grande embate que nós tivemos. Fui uma das demitidas e só voltei quando conseguimos a readmissão de todos. Nem o governo, nem a direção da Petrobrás queriam que voltássemos. Mas nós lutamos muito para que todos voltassem”.
Mizael Marcelly
Fotos: Arquivo do Sindipetro e Rede Social
Mizael Marcelly
Fotos: Arquivo do Sindipetro e Rede Social
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